Advogado é elo ainda mais sinistro entre Bolsonaro e Queiroz
Além de abrigar um foragido visceralmente ligado aos crimes atribuídos aos filhos de Bolsonaro, Wassef transitava à vontade no entorno presidencial
Publicado 18/06/2020 13:47 | Editado 19/06/2020 13:26
Não é mera coincidência o fato de que o desaparecido Fabrício Queiroz estivesse foragido num imóvel em Atibaia (SP) que pertence a Frederick Wassef, advogado da família de Jair Bolsonaro. Segundo a jornalista Thaís Oyama, autora de Tormenta, o Governo Bolsonaro – Crises, Intrigas e Segredos, Wassef não é apenas um prestador de serviços para o clã.
Ele próprio se apresentava como o responsável pelo projeto político que levou um parlamentar improdutivo e extremado à Presidência da República. “Não só fui o primeiro a acreditar no Bolsonaro – mas também fui o primeiro a colocar na cabeça dele a ideia de concorrer à Presidência”, costumava gabar-se o advogado.
Do ponto de vista político, Wassef é um ultradireitista. Na casa de sua propriedade onde Queiroz foi encontrado, havia uma faixa com referência ao AI-5 (Ato Institucional Número 5), o “golpe dentro do golpe”, implantado em 1968, sob a ditadura militar brasileira, para endurecer ainda mais o regime. O advogado colecionava também bonecos do filme Scarface (1983), que conta a vida criminosa e errática do mafioso Tony Montana à frente do tráfico em Miami (EUA).
Thaís Oyama – que ajudou a dissecar os bastidores da eleição de Bolsonaro e de seu primeiro ano no Planalto – afirma que Wassef, mais do que advogado, “é pessoa de extrema confiança da família (…). Além de representar Flávio em processos, ele atua no caso da facada do presidente Jair Bolsonaro, que sofreu um atentado na campanha presidencial”.
Vem de sua mente fantasiosa a teoria da conspiração segundo a qual Adelio Bispo, autor do atentado contra Bolsonaro, em 2018, foi apenas o executor de um crime supostamente encomendado por uma organização criminosa. Até o momento, porém, dois inquéritos, ambos já finalizados, concluíram que Adélio agiu por iniciativa própria, sem ajuda de terceiros – até o Supremo Tribunal Federal (STF) chegou a se manifestar nesse sentido.
Além de abrigar um foragido visceralmente ligado aos crimes atribuídos aos filhos de Bolsonaro, Wassef transitava à vontade no entorno presidencial. Não por acaso, esteve presente e deixou-se fotografar nesta quarta-feira (17) na posse de Fabio Faria como ministro das Comunicações.
Queiroz, preso hoje, foi assessor do senador Flávio Bolsonaro (Republicanos-RJ) quando este era deputado estadual. Contra ele pesa a acusação, farta de provas, de liderar um esquema de “rachadinha” na Assembleia Legislativa do Rio – ou seja, de contratar funcionários fantasmas para o gabinete do filho de Bolsonaro e reter seus salários, parcial ou totalmente.
“Quando, em dezembro de 2018, o caso Queiroz estourou no noticiário, Wassef assumiu a estratégia de defesa de Flávio. Contrariando os advogados que aconselhavam a família naquele momento, ele convenceu o presidente eleito que o melhor a fazer para abafar a história seria tirar Queiroz e o Ministério Público Estadual do cenário e, por meio do foro privilegiado de Flávio, jogar o caso para o STF”, lembra Thaís Oyama.
A estratégia ajudou a proteger os crimes de Queiroz e da família Bolsonaro, já que, em julho de 2019, o ministro Dias Toffoli, presidente do Supremo, suspendeu as investigações baseadas no compartilhamento de dados bancários, como os do Conselho de Controle de Atividades Financeiras (Coaf), sem uma prévia autorização judicial.
Centenas de denunciados foram beneficiados – com destaque para Flávio Bolsonaro, que viu as investigações contra si serem paralisadas. A decisão, ruidosamente comemorada pelos Bolsonaro e por Wassef, conseguiu travar a apuração até novembro, quando o plenário do Supremo derrubou a liminar de Toffoli – e o caso Queiroz foi retomado.
Em setembro do ano passado, durante uma entrevista, Wassef disse que não sabia o paradeiro de Queiroz e negou que fosse o advogado dele. Agora, o caseiro que cuida do imóvel onde o ex-assessor de Flávio foi encontrado afirmou que ele já estava lá havia cerca de um ano.
O escandaloso envolvimento de Wassef e Queiroz tem tudo para reavivar o chamado “caso Evandro” – outro episódio nebuloso na trajetória do advogado. Em 1992, o menino Evandro Ramos Caetano, de 6 anos, desapareceu em Guaratuba (PR). Seu corpo foi encontrado poucos dias depois em um estado deplorável: sem as vísceras, o couro cabeludo, as mãos, entre outros detalhes macabros.
Sete pessoas foram presas acusadas pelo rapto e assassinato do garoto, incluindo a então primeira-dama da cidade Celina Abagge e sua filha, Beatriz Abagge. Wassef também foi preso, sob a acusação de integrar a seita Lineamento Universal Superior, que estaria por trás do crime tão hediondo. Como não se confirmou sua participação na morte de Evandro, Wassef foi solto dias depois. Se não estava envolvido nesse caso de 28 anos atrás, agora o advogado terá muito mais dificuldade para comprovar que não é um elo ainda mais sinistro entre a família Bolsonaro e Fabrício Queiroz.
Da Redação, com agências