Breno Altman: Quem ganhou a Segunda Guerra Mundial?
Protagonismo do Exército Vermelho levaria à consolidação da União Soviética e à criação de um campo socialista na Europa, além de impulsionar formidável movimento de descolonização e libertação nacional na África e na Ásia.
Publicado 08/05/2020 10:57
Às 23h45 do dia 8 de maio de 1945, em Karlshorst, subúrbio de Berlim, o marechal de campo Wilhem Keitel assinava a capitulação incondicional das tropas alemãs, rendendo-se aos comandos militares das forças aliadas. Findava-se, depois de quase seis anos, o maior embate militar da história.
O protagonismo do Exército Vermelho levaria à consolidação da União Soviética e à criação de um campo socialista na Europa, além de impulsionar formidável movimento de descolonização e libertação nacional na África e na Ásia. Era o início da Guerra Fria, com a contraposição de dois sistemas antagônicos.
Esse conflito também se refletiria na historiografia sobre a Segunda Guerra Mundial. Para o bloco comandado pelos Estados Unidos, era decisivo apagar, diminuir ou confundir o papel soviético na campanha contra Hitler, mesmo contra fatos notórios.
Quando as tropas anglo-americanas abriram a segunda frente, ao Ocidente, com o desembarque na Normandia, em junho de 1944, a sorte do nazismo já estava selada. Os soldados da URSS marchavam impetuosamente rumo a Berlim, após a vitória na Batalha de Stalingrado, no início de 1943, com o comprometimento irreversível dos exércitos alemães.
Os movimentos decorrentes da Operação Overlord provavelmente apressaram a rendição alemã. A derrocada do “reich” hitlerista, no entanto, configurava-se inevitável mais de um ano antes do Dia D.
Os custos humanos também são reveladores. Ao redor de 25 milhões de vidas soviéticas foram ceifadas, contra um milhão na soma de britânicos e norte-americanos. Esses óbitos registram o esforço de guerra que coube às nações envolvidas.
Outra prova da relevância periférica dos países capitalistas na guerra europeia foi lançada pelas bombas atômicas sobre Nagasaki e Hiroshima, no Japão, em agosto de 1945. Os Estados Unidos recorreram ao assassinato em massa para precipitar a rendição nipônica, antes que a União Soviética, liberada em sua frente ocidental, ganhasse mais influência sobre a Ásia, onde os partidos comunistas da China, do Vietnã e da Coreia avançavam em marcha batida.
Frente às dificuldades de uma narrativa pró-Ocidente em termos militares, uma das opções tem sido o revisionismo histórico. Exemplo dessa conduta está na atribuição da guerra ao Pacto Molotov-Ribbentrop, firmado pelos chanceleres da URSS e da Alemanha, em agosto de 1939, dias antes de a Polônia ser invadida. Essa versão, aliás, foi recentemente aprovada pelo Parlamento Europeu.
Omite-se que tal acordo foi uma resposta ao chamado Pacto de Munique, assinado em 1938, pelo qual Inglaterra e França aceitaram ceder parte da Tchecoslováquia a Hitler, recusando a oferta de Stalin para uma aliança contra o nazismo e sinalizando que lavariam as mãos se a Alemanha dirigisse seu poderio militar contra a União Soviética.
O chefe bolchevique, em arriscada manobra diplomática, tratou de fazer concessões aos nazistas para que antes atacassem os demais Estados capitalistas, adiando por quase dois anos o inevitável enfrentamento contra as tropas hitleristas, que invadiriam seu país em junho de 1941, quando a primeira nação socialista estava bem mais preparada.
A União Soviética, em Munique, tinha sido marcada para morrer, debaixo do tácito compromisso entre o nazismo e as democracias liberais. Sobreviveu a essa armadilha para liderar o triunfo sobre Hitler, impedindo que o mundo caísse sob o domínio do imperialismo alemão.
Quando a humanidade comemora, a cada 8 de maio, a vitória da liberdade, nada mais justo que recordar como essa saga foi possível.