Na conta de Bolsonaro
Absolutamente belicoso, negligente e incompetente, o Governo Federal conduzido por Bolsonaro aprofunda a incerteza e promove a angústia. Sem coordenar a construção de uma solução coletiva, força a população a arriscar a vida em busca de saídas individuais.
Publicado 07/05/2020 16:43
A tragédia anunciada provocada pela propagação do coronavírus tem ganhado contornos dramáticos com o registro diário de centenas de óbitos a ela relacionados. Não obstante, enquanto essa situação era gestada, a ação do presidente Bolsonaro se voltava não a evitá-la, mas ora a negar sua gravidade, ora a retratá-la de modo a transferir a responsabilidade para governadores e prefeitos. Em vão.
A experiência dos últimos meses em todo o mundo tornou quase unanimidade o afastamento social como medida necessária para reduzir os impactos do coronavírus, cabendo a governadores e prefeitos seguir essa indicação conforme as especificidades locais. É isso que eles podem e devem fazer. Evidentemente o afastamento é incômodo para todas as pessoas, que se vêm obrigadas a suspenderem atividades que apreciam. Mais incômodo ainda é para quem mora em condições precárias, em habitações acanhadas abrigando várias pessoas com rotinas diversas. E, mais que incômodo, é desesperador para aqueles desprovidos de renda necessária para satisfazer suas necessidades básicas. Ocorre que governos locais enfrentam enormes restrições em sua ação para conter esse desespero, e apenas o Governo Federal possui as condições necessárias para isso.
Apenas o Governo Federal é capaz de emitir moeda e se endividar para realizar os grandes gastos emergenciais em saúde e para transferir recursos para os milhões de trabalhadores que viram seus rendimentos desaparecer ou cair abruptamente. Apenas o Governo Federal regula o sistema financeiro e possui grandes bancos públicos para conduzir uma política que forneça a liquidez para que as empresas possam honrar seus compromissos mais urgentes. Apenas o Governo Federal pode organizar nacionalmente a renegociação com moratória e reescalonamento compulsórios de compromissos financeiros para reduzir de forma ordenada a atividade econômica sem que as empresas quebrem. E apenas o Governo Federal pode assumir a liderança, criar um discurso unificado e coordenar a ação de grupos e interesses divergentes em busca de um objetivo comum reconhecido como tal.
Contudo, ao fazer o que só ele pode e deve fazer, o Governo Federal tem se mostrado desastroso. Se mostrou absolutamente incapaz de planejar e executar os gastos, comprando os insumos necessários para salvar vidas e evitar que o sistema de saúde entre em colapso. Se mostrou absolutamente insensível e incompetente na transferência de renda a quem dela precisa, pagando um benefício emergencial apenas após ser obrigado a isso pelo Congresso, operacionalizando-o de forma caótica, divulgando informações e previsões equivocadas e gerando filas imensas em todo o país que só contribuem para propagar a doença.
Se mostrou absolutamente inapto para organizar a redução da atividade das empresas, lançando de forma muito lenta medidas mal desenhadas – algumas tendo sido inclusive revogadas –, mal explicadas, acanhadas em volume e escopo e desconexas entre si. Se mostrou absolutamente avesso a buscar os consensos mínimos requeridos para criar confiança na condução do enfrentamento da calamidade pública, ao desdenhar de sua gravidade e questionar a recomendação científica em favor do isolamento social adotado pelos entes subnacionais, pressionando quando não hostilizando seus chefes eleitos, assim como o Congresso e o sistema judiciário. Absolutamente belicoso, negligente e incompetente, o Governo Federal conduzido pelo presidente Bolsonaro aprofunda a incerteza e promove a angústia. Sem coordenar a construção de uma solução coletiva, força a população a arriscar a vida em busca de saídas individuais. Como resposta à calamidade, promove a lei da selva.
Nessa situação, angustiados pela perspectiva de quebra de suas empresas, fonte de seu sustento, os pequenos empresários se juntam aos grandes, desgostosos com a diminuição de seus lucros, para pressionar publicamente pelo fim do isolamento. Angustiados pela falta de renda para sobreviver hoje e de emprego para sobreviver no futuro, os trabalhadores, com frequência acostumados com a morte de próximos em meio à violência e desigualdade que marcam o Brasil, praticam cada vez menos o isolamento, de resto especialmente penoso nas condições precárias em que grande parte deles vive.
Com o relaxamento do isolamento, as mortes continuarão a avançar. Por perseguir esse relaxamento com suas ações e omissões, a responsabilidade maior por essas mortes é do presidente que conduz o Governo Federal, e dos civis e militares que com ele contribuem em altos cargos. Elas vão cair em seu colo, nas suas costas. Apesar das tentativas de transferir essa responsabilidade, as mortes vão cair na conta de Bolsonaro.
Fonte: Brasil Debate