Não existe mais surpresa na Copa do Mundo – Por Thiago Cassis
Muito se fala do equilíbrio entre as seleções da Copa, sobre a semelhança entre os sistemas táticos, e certamente essa é uma questão bem evidente. Mas as tentativas de responder os motivos são escassas…
Por Thiago Cassis*
Publicado 30/06/2018 10:59
Obviamente não é possível apontar uma só razão para explicar o “equilíbrio”, ou a similaridade na disposição dos jogadores em campo, entre as seleções da Copa. Mas vamos nos atentar a um fator que explica muita coisa, que é o fato dos jogadores atuarem nos mesmos campeonatos.
Muitas seleções que surpreenderam a todos em Copas do Mundo com esquemas inovadores, como a Hungria de 1954, ou a seleção holandesa de 1974, mesmo com o Ajax já sendo tri campeão da Champions League (que ainda era conhecida como Copa dos Campeões), ou zebras famosas, como Camarões de 1990, tinham algo a seu favor que era o elemento surpresa. Essas equipes eram compostas basicamente por atletas que atuavam em seus países de origem.
Dessa forma, e ainda acrescentando a questão da tecnologia na época não permitir que uma pessoa assistisse a tantos campeonatos de fora de seu país, as seleções podiam chegar na Copa com “surpresas”, seja por conta de talentos individuais ou esquemas táticos diferentes.
A partir do momento, que após a Lei Bosman, e a globalização avançada que ocorreu a partir dos anos 90 no futebol, todos os atletas de alto rendimento do planeta começaram a se concentrar nas mesmas ligas, o futebol de seleções começou a ficar cada vez mais equilibrado. Para termos uma ideia, os números demonstram essa concentração de jogadores nos mesmos torneios europeus: dos 736 jogadores que participam da Copa do Mundo, 107 jogam na Inglaterra, 79 na Espanha, 64 na Alemanha, 58 na Itália e 49 atuam em gramados franceses. Dessa forma, temos 357 jogadores, a metade dos atletas que estão na Rússia disputando a Copa, jogando nos mesmos campeonatos.
Então, quando assistimos a Nigéria, por exemplo, contra a Argentina, estamos observando jogadores que atuam muitas vezes nas mesmas equipes e nos mesmos certames. Não existe elemento surpresa nenhum.
E para completar, esse nosso esboço para iniciarmos a discussão sobre a paridade tática (embora ainda não de talentos individuais) no mundial, temos também a questão do pouco tempo para as seleções se prepararem. Se antigamente, as equipes se juntavam com quase um mês para treinar, agora são apenas alguns dias para tentar minimizar os efeitos das exaustivas competições europeias. É muito mais fácil para o treinador da seleção, senão a única coisa possível, colocar os seus comandados para atuar da mesma forma que já atuam em gramados europeus, do que em poucos dias, tentar algo inovador, e provavelmente ser despachado já na primeira fase.
Outra possibilidade é entrosar o time durante as eliminatórias, mas nem sempre o selecionado permanece o mesmo por 4 anos. E cada vez mais as chamadas “datas FIFA”, onde acontecem os encontros entre seleções, são um problema para o planejamento das poderosas equipes europeias.
O debate é longo, ficamos por aqui com essa pequena reflexão, mas fica claro que o futebol de seleções precisa se reinventar, ou cada vez mais parecerá apenas um catado de jogadores que atuam na Europa, se juntando durante um mês a cada quatro anos, para lembrarem a si mesmos e seus conterrâneos, que nasceram nesse ou naquele país…