EUA separam 2 mil crianças das famílias na fronteira em seis semanas
“Odeio que as crianças estejam sendo separadas”, diz Trump. Mas foi a sua Administração que decidiu acusar criminalmente os adultos que vêm do México. Pediatras falam em “danos irreparáveis” para os menores envolvidos. Filhos e filhas de imigrantes estão detidos em armazéns
Publicado 18/06/2018 17:51
O Departamento de Segurança Interna dos Estados Unidos disse que só entre 19 de abril e 31 de maio, 1995 crianças foram separadas de 1949 adultos, alvo de processos criminais.
Não se sabe a idade destes menores, mas têm sido divulgadas imagens de crianças muito pequenas. Foram recebidas em centros de detenção no Texas ou colocadas em casas de acolhimento de crianças para adoção.
No Vale do Rio Grande, no Texas, o “corredor” mais movimentado para os migrantes que tentam entrar nos Estados Unidos, os responsáveis pela patrulha da fronteira dizem que separar os adultos das crianças é uma forma de reprimir a imigração e dissuadir novas entradas ilegais. Garantem que todos os detidos recebem alimentação adequada e têm acesso a assistência médica, chuveiros e roupa lavada.
Este é o resultado da política de” tolerância zero” decidida pela Administração de Donald Trump e defendida nos últimos dias com citações da Bíblia pelo seu procurador-geral, responsável pelo Departamento de Justiça, Jeff Sessions, e pela porta-voz da Casa Branca, Sarah Sanders. Face a repetidas perguntas dos jornalistas, esta insistiu, na quinta-feira (14), que “fazer cumprir a lei” é algo defendido em “várias passagens bíblicas”.
Já o secretário de Justiça, Jeff Sessions, citou a Bíblia para justificar a separação das famílias detidas na fronteira. Segundo Sessions, ter filhos não dá imunidade aos migrantes para cometer o delito de cruzar a fronteira e citou o apóstolo Paulo em uma passagem da Bíblia: “obedeça as leis do governo, porque Deus enviou o governo para seus propósitos”.
Grupos religiosos e de defesa dos direitos humanos têm criticado duramente a medida de Trump que qualificaram como “desumana”, sobretudo desde que se foi percebendo que as crianças estavam sendo tiradas dos pais na entrada nos Estados Unidos.
A ONU denuncia “violação grave dos direitos da criança”. Cinicamente, Trump atribui a medida a uma lei proposta por democratas durante o governo Obama e que objetivava eliminar o tráfico de crianças. Em entrevista Trump disse que para mudar a lei "precisa do apoio dos democratas".
O republicano Paul Ryan, presidente da Câmara dos Deputados, se pronunciou em conferência à imprensa dizendo que o parlamento não quer as crianças separadas de suas famílias e que é necessário resolvê-lo mediante uma lei migratória. Um grupo de parlamentares democratas já apresentou um novo projeto de lei para por fim à prática, mas a líder do bloco, Nancy Pelosi, disse não ver perspectiva na aprovação da nova lei. Apontar o dedo para os democratas não está mais convencendo, já que há muitos republicanos se opondo a atual política.
As falhas de Trump para resolver a situação
São os chamados Dreamers, perto de 800 mil pessoas que chegaram levadas pelos pais e estavam protegidas pela lei DACA (Deferred Action for Childhood Arrivals), aprovada em 2012 pelo presidente anterior, Barack Obama. Sem lhes conceder a cidadania, a lei dava uma proteção renovável de dois em dois anos a estas pessoas, impedindo que fossem deportadas – muitas nem falam a língua dos pais nem visitaram nunca os países de origem, estudando ou trabalhando há anos nos Estados Unidos.
A estratégia de Trump fracassou e o Congresso nunca chegou a um acordo para uma nova lei que substitua a DACA. Tanto num como noutro partido, os congressistas não vêem grandes possibilidades de conseguirem aprovar uma nova lei geral de imigração (pondo fim à separação das famílias). Apesar de tudo, os líderes republicanos estão tentando mediar um entendimento entre conservadores e moderados para uma proposta que permita às famílias permanecerem unidas, ao mesmo tempo que desbloqueie mais fundos para o muro, ofereça um caminho para a cidadania aos Dreamers e impondo novos limites à imigração legal.
A Casa Branca deu sinais que apoiaria essa lei se os legisladores a aprovassem. Mas alguns republicanos linha dura recusam apoiar qualquer texto que abra a porta a conceder cidadania aos que chegaram quando eram crianças ou que mantenha as famílias atualmente separadas juntas, ao mesmo tempo que não será fácil conquistar democratas para uma proposta que desse mais dinheiro para construir o muro.