Vannuchi defende frente ampla em torno dos pressupostos democráticos
Em entrevista ao Sul21, o ex-ministro dos Direitos Humanos Paulo Vannuchi considera que a intervenção militar no Rio de Janeiro, decretada por Michel Temer, é "irresponsável" e "danosa aos direitos humanos. Ele também defende a organização de uma frente ampla nas eleições de outubro para garantir a defesa da democracia.
Publicado 12/03/2018 14:46
"As eleições de 2018 têm que acontecer e tem de ser numa frente mais ampla, que volte aos princípios. Nossa tarefa principal é unir forças em torno dos pressupostos democráticos e reconhecendo que será uma luta de alguns anos, que não vai se decidir na eleição desse ano. Tem que alterar o Legislativo, tem que reformar o Judiciário, para sejam dignos desse nome.direitos humanos", defendeu o ex-ministro.
Para ele, a intervenção é "absolutamente irresponsável do ponto de vista político e é danosa aos direitos humanos". "Com a Comissão Interamericana, estive em países de conjuntura semelhante ao RJ, como Honduras, Guatemala, tivemos reuniões com os presidentes dizendo que a utilização de Forças Armadas, para enfrentar o crime constitui violação de padrões do sistema interamericano de direitos humanos. No México, o uso das Forças Armadas para enfrentar o crime organizado foi um desastre", enfatizou Vanucchi, que integrou a Comissão Interamericana de Direitos Humanos (CIDH), da Organização dos Estados Americanos (OEA).
Segundo Vanucchi, o uso das tropas militares na intervenção é um desvio que pode provocar consequências negativas para o país. "Se sabe que as Forças Armadas são feitas para defender fronteiras, soberania nacional, num contexto de guerra. A relação do soldado militar é para liquidar o inimigo. Ali não existe isso. Existe um traficante, um criminoso, em cada favela do Rio, de São Paulo, de Porto Alegre, para cada mil, 10 mil pessoas que são trabalhadoras, cidadãos e cidadãs honestos", frisou.
Ele rechaçou os comentário do general Villas Bôas, comandante das Forças Armadas, que ao reivindicar segurança jurídica para as tropas, disse que as ações dos militares poderia resultado em uma nova Comissão da Verdade.
"Dizer que ele quer uma anistia preventiva, uma carta-branca para os militares fazerem o que quiserem, é um descalabro completo e tem também um componente muito ruim. O subtexto dele é dizer que “em 1964, vocês civis nos pressionaram para derrubar um governo comunista – como se João Goulart pudesse ser considerado comunista! – salvamos o Brasil desse perigo e a democracia retribuiu com uma CNV”. Mas, a CNV não estava julgamento Exército, Marinha e Aeronáutica. Estava julgando dúzias de torturadores, criminosos que violam, inclusive, a honra e o brio militares. Pendurar no pau-de-arara uma prisioneira política jovem, submetê-la a sevícias sexuais, estupros, violações", enfatizou.
Vanucchi destaca que outros países decidiram recorrer a esse remédio da intervenção militar para o combate ao crime organizado e ao tráfico de drogas e o resultado foi um completo fracasso.
"Não tem nenhuma experiência no mundo que possa ser apontada como positiva na intervenção das Forças Armadas. Pior, ela é ruim também para as Forças Armadas, que sai com traumas internos. Eu sei que se morrer um jovem recruta, com uma bala disparada pelo Comando Vermelho, a Rede Globo já preparou toda a cenografia. Vai haver um espetáculo de mitificação, mas terminada a intervenção em 31 de dezembro, o risco maior é de que o crime organizado esteja mais entrosado", apontou o ex-ministro.
E acrescenta: "O que aconteceu no México, onde a intervenção das Forças Armadas era o sagrado remédio para resolver o problema, levou a 100 mil desaparecidos nos últimos 10 anos. Há um caso político, que é o desaparecimento de 42 estudantes de Ayotzinapa. Jovens que foram massacrados a caminho de um evento, em que eles recolheriam fundos para participar de um ato na capital do México lembrando o massacre do movimento estudantil de 1968, quando tanques de guerra entraram no meio da multidão de jovens, disparando com metralhadoras".
Questionado se a candidatura do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva está ameaçada, Vanucchi é categórigo: "Totalmente ameaçada".
"Existe um crime de lesa-pátria em andamento, que não pode nos deixar presos a detalhes. O golpe desse tipo tem que ser liderado por uma figura menor, pequena, como é Michel Temer (MDB). São essas figuras menores que dizem: me livrem da cadeia, que eu apoio tudo. A luta agora é em primeiro lugar não permitir a prisão de Lula", defendeu.