Associação denuncia a Dilma violência obstétrica do caso Adelir
A Associação Artemis, que apoia mulheres que sofreram perda gestacional, protocola nesta sexta-feira (4), na Secretaria-Geral da Presidência da República, denúncia de violência obstétrica e violação de direitos humanos sobre a decisão judicial proferida pela juíza Liniane Mog da Silva, titular da Vara Criminal de Torres, no Rio Grande do Sul., que obrigou uma gestante a se submeter a uma cirurgia cesariana contra sua vontade.
Publicado 04/04/2014 13:22
Atuando em plantão no dia 31/03/2014, a magistrada determinou o encaminhamento da gestante Adelir Carmen Lemos de Góes a um hospital local na cidade litorânea Torres, para realização de uma cirurgia cesariana sob a justificativa de resguardar “os direitos do nascituro”, o que não era vontade da gestante.
Casada, mãe de outros dois filhos de 7 e 2 anos, nascidos de cirurgias cesarianas, Adelir planejava ter seu terceiro filho de parto normal. Tendo realizado exames no hospital local Nossa Senhora dos Navegantes, na segunda-feira (31), sempre acompanhada de sua doula (profissional de parto), verificou-se que a pressão arterial da mãe estava boa e os batimentos cardíacos do bebê também.
No entanto, uma ecografia sugeria que o bebê estivesse “em pé” e a médica que avaliou a ecografia recomendou sua internação para realização de cirurgia cesariana imediata. Adelir suspeitou que o resultado da ecografia não estivesse correto, tendo em vista os exames anteriores, e resolveu realizar uma segunda ecografia em outra instituição. Ao deixar o hospital assinou um termo de responsabilidade isentando o hospital local.
A gestante retornou para casa, onde permaneceu a fim de aguardar o início do trabalho de parto de forma natural para posteriormente se encaminhar de novo ao hospital local para ter seu bebê de parto normal no ambiente hospitalar, como era sua vontade.
Porém, à noite, já em franco trabalho de parto, ela foi surpreendida em sua casa por um oficial de justiça acompanhado de duas viaturas e policiais armados, munidos de um mandado judicial para encaminhamento de Adelir até o hospital local com o objetivo para realizar a cirurgia cesariana. Diante da confusão instaurada, houve agressão verbal por parte da polícia contra Adelir e seu marido, que quase foi algemado dentro de sua própria casa.
Além da Secretaria-Geral, a Artemis também encaminhou denúncia aos seguintes órgãos: Secretarias de Políticas para Mulheres e de Direitos Humanos, ambas vinculadas à Presidência da República, Dique Denúncia de Direitos Humanos; Comissão de Saúde da Mulher do Ministério da Saúde; ONU Mulheres; Comissão de Direitos Humanos e Minoria da Câmara dos Deputados; Secretaria de Direitos Humanos do Estado do Rio Grande do Sul, Promotoria De Justiça De Defesa dos Direitos Humanos De Porto Alegre; Comissão de Direitos Humanos da OAB/Rio Grande do Sul.
Em todas as denúncias encaminhadas, a Artemis solicita a intervenção do órgão para apuração das violações aos direitos humanos mencionados, a reparação cabível ao casal violado, bem como a realização de uma audiência pública para a discussão urgente sobre as implicações do fato em violência obstétrica, no tocante a violência cometida contra a mulher.
A escolha da via de parto constitui um direito humano da parturiente com a finalidade de preservar sua integridade pessoal, liberdade e consciência, protegido pela Convenção Americana de Direitos Humanos (Pacto de San Jose da Costa Rica), de 22/11/1969, ratificada pelo Brasil em 25/09/1992, especialmente abarcando os seguintes direitos:
art. 7º. – direito à liberdade pessoal;
art. 12º – direito à libertada de consciência;
art. 17º – direito à proteção da família.
Condicionar o direito da gestante de escolher o local de parto à eventual determinação do poder público, na prática, impede o exercício desses direitos da mulher e abrem caminho para uma interpretação equivocada de que qualquer nascimento dependeria da aprovação do Estado. A imposição da cirurgia cesariana se configura ainda em violência obstétrica, a violência praticada contra a mulher no momento do parto.
A Constituição Federal (art. 6) e o Código Civil (art. 11) garantem a proteção ao parto e o direito de escolha da mulher sobre a forma como deseja dar a luz. Outra lei (11.108/05) assegura, ainda, o direito da parturiente de ter um acompanhante no momento do parto, o que foi negado a Adelir.
Segundo Raquel de Almeida Marques, presidenta da Artemis, a situação configura ato de violência obstétrica ao impor a Adelir uma intervenção contra sua vontade, ferindo sua integridade psicológica. Uma pesquisa realizada pela Fundação Perseu Abramo, revelou que uma em cada quatro mulheres sofre violência obstétrica.
"A violência obstétrica neste caso foi cometida. Todos contrariaram a vontade da gestante, o que fere ainda sua autonomia. A violência obstétrica é a apropriação do corpo e processos reprodutivos das mulheres pelos profissionais de saúde, causando a perda da autonomia e capacidade de decidir livremente sobre seus corpos. É nosso dever denunciar fatos graves como esse para prevenir e erradicar a violência obstétrica", declara Raquel Marques, presidenta da Artemis.
Fonte: Artemis