Construtoras temem fim do ”Minha Casa, Minha Vida”
Otimistas com os primeiros resultados do programa habitacional Minha Casa, Minha Vida, entidades e empresas da área já se preocupam com a sua continuidade após as eleições que acontecem neste ano. O setor espera que, independentemente do candidato vencedor da corrida presidencial, o governo indique que existem recursos e faça os ajustes necessários para que o programa federal avance.
Publicado 23/02/2010 16:31
O presidente do Sindicato da Indústria da Construção de São Paulo (SindusCon), Sérgio Watanabe, diz que os empresários esperam esse sinal de que devem continuar investindo no setor. “O Minha Casa, Minha Vida é importante, mas é pontual. O que a sociedade quer é um programa que torne esse processo perene”, destaca Watanabe.
Na sua avaliação, a chance de a Caixa Econômica Federal atingir a contratação de 1 milhão de casas através do programa até o final de 2010 é factível: “Demanda existe, o nosso déficit habitacional está em aproximadamente 5,5 milhões de unidades, sendo que a maior parte se concentra na faixa de até cinco salários mínimos.”
“É preciso chegar a uma política de habitação perene, de Estado e não de governo. Para suprir o atual déficit habitacional seria necessário um programa como esse a cada dois anos”, concorda João Crestana, presidente do Sindicato da Habitação de São Paulo (Secovi-SP), ao avaliar que esse é apenas o primeiro passo para resolver o problema em até 20 anos.
Crestana também avalia que é primordial garantir os recursos para a continuidade do programa que, segundo ele, ainda precisa de alguns ajustes. Crestana calcula que seriam necessários mais R$ 20 bilhões para sua continuidade. “É preciso fortalecer as empresas para produção em escala, criar massa crítica, treinar a mão de obra. Assim chegaremos a um produto de qualidade, com custo menor”, defende o executivo.
Crestana pede ainda o fortalecimento do aspecto jurídico do programa. “Se um projeto é aprovado é fundamental termos a garantia que essa autorização será mantida”, ressalta, ao considerar que essa insegurança atrapalha muito o Minha Casa, Minha Vida.
Baixa renda
Também satisfeito com os resultados iniciais do programa, o diretor-presidente da Rodobens, Eduardo Gorayeb, destaca que o setor pleiteia, na verdade, um instrumento que oficialize a obrigatoriedade de sua manutenção: “Esse programa habitacional foi tão importante que mudou o foco das construtoras, que hoje, em sua maioria, estão atuando no segmento de baixa renda. Temos certeza que ele continuará mesmo se houver mudanças no cenário político, pois envolve um planejamento de longo prazo. O que foi contratado em 2010, por exemplo, será concluído em 2011, 2012.”
Antonio Fernando Guedes, diretor geral da Living, divisão da Cyrela que atende o segmento de baixa renda, defende um debate conjunto com o governo para que o programa seja aprimorado. “Sua continuidade é esperada e necessária não só para as construtoras, mas para o público consumidor. Essa primeira fase foi importante para a adaptação ao sistema, acredito que agora ganharemos mais velocidade no processo”, acrescenta Guedes.
André Sampaio, diretor da ASA Incorporadora, braço de baixa renda da Agre — empresa criada a partir da combinação da Agra, Abyara e Klabin Segall — avalia que “o melhor ainda está por vir” no que se refere ao programa habitacional. “A Caixa precisou de um tempo para implantar o programa e tem conseguido cumprir o prometido. Passada essa fase, a perspectiva é que nos próximos meses veremos mais agilidade no processo”, afirma Sampaio.
Boom imobiliário
O brasileiro nunca financiou tanto imóvel como em 2009, e a tendência é de que novos recordes sejam batidos neste ano. Para alguns, o país está em pleno boom imobiliário. Para outros, é só o início desse processo, uma vez que o déficit habitacional, entre 6 milhões e 8 milhões de unidades, conforme o cálculo, ainda é elevado.
Avaliações distintas à parte, o fato é que o setor vive seu melhor momento na história recente, que já leva os bancos a discutir alternativas de recursos para bancar a expansão. Hoje, a maior parte do dinheiro (cerca de 70%) vem da caderneta de poupança, mas, segundo especialistas, essa fonte deve se esgotar, dependendo da instituição financeira, já em 2011.
No ano passado, 302,7 mil unidades foram financiadas com os depósitos da caderneta, em um total de R$ 34 bilhões. Nem na época do finado Banco Nacional da Habitação (BNH), no início dos anos 80, tantos imóveis foram vendidos por meio de empréstimos no País. “O Brasil é a bola da vez como mercado relevante para experimentar uma forte expansão do crédito imobiliário”, define o diretor-geral da Montreal Informática, Luís Antônio Santos.
Alienação
A empresa vende soluções tecnológicas para diversos setores da economia, entre eles o imobiliário. Os principais bancos que atuam no País fazem parte de sua clientela. O diretor de Crédito Imobiliário do Itaú Unibanco, Luiz França, que também preside a Associação Brasileira das Entidades de Crédito Imobiliário e Poupança (Abecip), lista os fatores que explicam o desempenho recente e as boas perspectivas. Em primeiro lugar, a segurança jurídica, obtida com a mudança da legislação promovida em 2004.
Foi ali que se instituiu o mecanismo de alienação fiduciária, que facilita a retomada do imóvel em caso de inadimplência. Em segundo lugar, França cita o alongamento dos prazos de financiamento para até 30 anos, que permitiu a redução das prestações mensais. Em terceiro lugar, o executivo destaca a estabilidade da economia.
De um lado, essas condições mais estáveis abriram caminho para a queda dos juros. De outro, elevaram o poder aquisitivo da população (como mostra a ascensão de milhões de brasileiros à classe C), o que reduz o calote. Um fator mais recente é o programa do governo Minha Casa, Minha Vida.
Média
Nesse ambiente, os bancos privados, que sempre foram reticentes em investir no mercado imobiliário, mostram grande apetite. Na média, preveem alta de 30% a 40% nos empréstimos este ano. Em 2009, segundo o Banco Central, o crédito para a habitação avançou 41,5%, ante 14,9% do crédito total. “Vemos o crédito imobiliário como motor da expansão do crédito geral (no País)”, diz o diretor executivo de Negócios Imobiliários do Santander Brasil, José Roberto Machado.
Segundo ele, no mundo, o financiamento imobiliário responde, em média, por 65% da carteira de crédito do banco. No Brasil, são 5%. O diretor de Crédito Imobiliário do HSBC, Antonio Barbosa, afirma que a meta da instituição é aumentar a participação no segmento nos próximos anos.
“Queremos crescer acima da média do mercado”, explica. A aposta do banco é no que Barbosa classifica de “serviço diferenciado”.No Bradesco, o discurso é parecido. “Queremos mais mercado”, diz o diretor do Departamento de Empréstimos e Financiamentos, Nilton Pellegrino. O objetivo é aproveitar que “não há cidadão no Brasil que não queira ter imóvel próprio”.
As informações são do jornal O Estado de S. Paulo