Governador biônico da ditadura é o novo Presidente da Assembléia do ES
O Ex Governador biônico da ditadura militar, Élcio Álvares (DEM) foi eleito por unanimidade Presidente da Assembléia Legislativa do Estado do Espírito Santo. Os deputados fecharam os acordos no final de semana e confirmaram a adesão à chapa indicada pelo Palácio Anchieta. A chapa palaciana foi montada de olho nas alianças partidárias para 2010 pelo governo Paulo Hartung (PMDB).
Por Ricardo Tristão*
Publicado 12/06/2009 20:29 | Editado 04/03/2020 16:42
O deputado estadual Élcio Álvares (DEM) foi eleito por unanimidade como presidente da Assembleia Legislativa do ES. A eleição aconteceu no início da tarde desta segunda-feira (02/02), na sede do Legislativo capixaba, na Enseada do Suá, em Vitória. É a primeira vez na história que um candidato à Mesa Diretora é eleito com voto de todos os parlamentares.
Além de Élcio, a nova Mesa é composta por Rodrigo Chamoun (PSB), como vice-presidente, e Da Vitória (PDT) como segundo vice-presidente. O primeiro secretário é Marcelo Coelho (PSDB), o segundo secretário é Givaldo Vieira (PT), Dary Pagung (PRP) ocupa da terceira secretaria e Wanildo Sarnáglia é o quarto secretário.
Paulo Hartung
A escolha da nova Mesa Diretora da Assembleia consagrou o poder de articulação do vice-governador Ricardo Ferraço filho de Theodorico Ferraço (DEM) Ex prefeito de Cachoeiro de Itapemirim por cinco mandatos. Nos meios políticos, a composição da nova Assembleia reflete um movimento de preparação do tabuleiro político para 2010. Mesmo com restrições no plenário, o Vice Governador conseguiu emplacar uma chapa governista do seu interesse com clara demonstração de alojar aliados , apesar do passado de Élcio Álvares a serviço da ditadura militar (1964-1985), levantadas por partidos de esquerda, movimentos sociais e pela Igreja.
Na 2ª Secretaria, a escolha do petista Givaldo Vieira (PT), causou mau estar na esquerda capixaba ao colaborar com a aproximação de Ricardo Ferraço vice de Paulo Hartung (PMDB) com o grupo político do prefeito da capital de Vitória, João Coser (PT). Nos meios políticos, a eleição de Givaldo poderá servir a um outra finalidade: preparar terreno para uma possível candidatura à Câmara dos Deputados, em 2010. Possibilidade que cria embaraço dentro do PT capixaba, já que ameaça os planos da atual deputada federal Iriny Lopes (PT).
Indignação
Segundo Isaías Santana do MOVIMENTO NACIONAL DE DIREITOS HUMANOS DO ESPÍRITO SANTO (MNDH-ES) eleger Élcio Álvares sem lembrar seu passado ''é tentar apagar ou alterar a história política do país, algo que fere o direito humano à memória e à informação. O Movimento Nacional de Direitos Humanos tem compromisso com a história e não pode se omitir ou permitir que ela se constitua como farsa que, assumida como verdade pelo meio político, se transforme em verdade absoluta.''
Isaias Santana, do MNDH-ES, lembra que Élcio Álvares (DEM) foi relacionado na CPI do Narcotráfico e que o apoio do executivo estadual, do Governador Paulo Hartung, ao nome do parlamentar contraria os compromissos assumidos por esse governo no combate ao crime organizado.
Abaixo transcrevemos a integra da nota do MNDH-ES publicada no sítio da Deputada Federal Iriny Lopes:
NOTA DO MNDH-ES SOBRE A ELEIÇÃO NA ASSEMBLÉIA LEGISLATIVA DO ES
A memória das violações e dos sujeitos violados é condição
essencial para combater todo tipo de prática que continua
alimentando e também patrocinando a
criminalização de lideranças e
movimentos que lutam por direitos.
Não somos espectadores passivos da história que
nos contam ou na qual querem nos fazer acreditar.
Somos sujeitos que fazem a história como luta pelo reconhecimento.
A memória e a verdade são bens públicos
com os quais construímos identidades
pessoais, sociais e culturais. Por isso,
constituem-se em direitos humanos.
(''Carta de Brasília'' –
Do Direito à Memória e à Verdade – MNDH – 2007)
O Movimento Nacional de Direitos Humanos no Espírito Santo (MNDH-ES) vem a público manifestar sua preocupação com a eleição da Mesa Diretora da Assembléia Legislativa do Estado e a ausência de debate sobre a questão. O acordo em torno do nome de Élcio Álvares para a Presidência da Mesa evidencia não só a conivência, a omissão, a falta de memória sobre o passado do referido candidato, mas se constitui, sobretudo, em desrespeito à sociedade capixaba, que há décadas luta contra o crime organizado no Espírito Santo.
É correto exigir uma pauta de mudanças, propostas para tornar o Legislativo mais transparente. Mas não considerar o passado de determinado candidato (assuma ele ou não as sugestões elaboradas) é tentar apagar ou alterar a história política do país, algo que fere o direito humano à memória e à informação. O Movimento Nacional de Direitos Humanos tem compromisso com a história e não pode se omitir ou permitir que ela se constitua como farsa que, assumida como verdade pelo meio político, se transforme em verdade absoluta.
Em nome do direito à memória, o MNDH-ES torna público os motivos pelos quais condena o acordo político entre os poderes Executivo e Legislativo para a eleição de Élcio Álvares à Presidência da ALES, recorrendo a duas das muitas reportagens, arquivos abertos, divulgados pela própria imprensa, que merecem ser lembrados:
– Revista IstoÉ (nº 1566 – 06 de outubro de 1999), reportagem “Defesa Aberta” (www.terra.com.br/istoe/politica/1999/10/01/000.htm):
“O serviço de inteligência do Palácio do Planalto e a polícia investigam envolvimento do ministro Élcio Álvares com o crime organizado”
“… O serviço de inteligência do Palácio do Planalto, comandado pelo general Alberto Cardoso, também está investigando as denúncias de que seu colega da Defesa teria envolvimento com o crime organizado …”
“… Na mira da polícia e dos arapongas do Planalto estão as ligações criminosas de juízes, parlamentares, empresários e policiais. As relações de Élcio com o presidente da Assembléia Legislativa, deputado José Carlos Gratz, dono de um império de jogatina, fazem parte da apuração…”
– Revista Veja (no 1632 – 19 de janeiro de 2000), reportagem “O futuro ex-ministro da Defesa” (www.veja.abril.com.br/190100/p_038.html)
“…Nascido em Ubá, Minas Gerais, Élcio Álvares entrou na vida política convidado pelos militares. Foi deputado federal pela Arena entre 1970 e 1974 e governador biônico do Espírito Santo entre 1975 e 1979. Eleito para o Senado em 1990 pelo PFL, comandou a tropa de choque do governo Collor no Senado ao lado de Antonio Carlos Magalhães. Ajudou a aprovar as reformas econômicas, administrativa e da Previdência, além da emenda que separou a carreira dos militares da dos servidores públicos civis. Ao tentar a reeleição em 1998, perdeu a vaga para Paulo Hartung…”
“…Élcio Álvares vinha sendo acusado de ter traficantes entre os clientes de seu escritório de advocacia em Vitória… O fato é que o ministro continuou titubeante. Sua reação contra os ataques ficou aquém da esperada pelo Palácio do Planalto. Apesar de estar convencido de que as acusações de ligação de Élcio Álvares com traficantes não se sustentam, FHC exigiu que ele reagisse, o que não aconteceu. O pior: na sexta-feira passada, havia rumores de que novas denúncias poderiam vir a público, prejudicando ainda mais a situação de Élcio. Até o general Alberto Cardoso, ministro-chefe do Gabinete Militar da Presidência, reconheceu que a situação de Élcio Álvares no governo é desfavorável…”
Note-se que a reportagem da IstoÉ já deixava evidenciada a influência política no Tribunal de Justiça, algo que veio à tona recentemente com a Operação Naufrágio. A venda de sentença, a procrastinação de julgamentos de crimes cometidos por políticos ou servidores públicos, para que os casos sejam prescritos, alimentam a violência e injustiça. A certeza da impunidade levou o Espírito Santo, em passado recente, a ser dominado por políticos e agentes públicos ligados ao crime organizado, a viver o terror de ter praticamente todas suas instituições contaminadas por pessoas e suas práticas criminosas.
Portanto, o processo eleitoral, a eleição nos Legislativos tem consonância com situações nos demais poderes. Não são fatos isolados e retirar a memória, o passado das discussões acerca desses poderes apenas contribui para que o Estado retorne a uma situação grave, combatida durante décadas pela sociedade civil e que causou a morte de muitos defensores de direitos humanos.
Em nome da verdade, do direito à memória, à história e à informação, rejeitamos o acordo de deputados estaduais e Poder Executivo para eleição da Mesa Diretora da Assembléia Legislativa. A Carta do MNDH de 2007 resume nosso sentimento e comprometimento histórico com a luta pela vida e dignidade do povo brasileiro e capixaba:
“Temos certeza de que somente nosso compromisso fará ecoar nossas vozes, afastando o silêncio que insistem em nos impor. O engajamento de todos/as é que fará com que a memória dos que tombaram, e continuam tombando na luta pelos direitos humanos, não seja em vão.''
Vitória, 31 de janeiro de 2009
MOVIMENTO NACIONAL DE DIREITOS HUMANOS DO ESPÍRITO SANTO
Fotos: Antonio Carlos Sessa Netto (Tonico)
*Ricardo Tristão é graduando em Ciências Sociais e Presidente do Comitê Municipal de Vitória do PCdoB-ES.