Por que gestores da memória cultural do país estão em greve?

Os servidores do Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (Iphan) – responsável pelo Estado de zelar pela memória cultural do Brasil – estão em greve em todo o Brasil reivindicando a implementação do Plano Especial de Cargos da Cultura aprov

O Iphan foi criado em 1937 e, desde então, a instituição vem realizando trabalhos responsáveis pela preservação do patrimônio cultural do Brasil, tanto o material como o imaterial, tidos na Constituição Federal de 1988 como portadores de referência à identidade, à memória e à ação dos grupos formadores da sociedade brasileira (Art. 216). A autarquia conta com mais de 1.300 servidores ativos e atua em todo o território brasileiro por intermédio de 53 representações distribuídas nos 27 estados e no Distrito Federal.


 


Entretanto, a política salarial absolutamente defasada, com o salário base de R$ 79 a R$ 500, inclusive para mestres e doutores, gera um desestímulo não só para os antigos servidores que gostariam de permanecer na instituição, mas também para os recém-concursados. Quase 70% dos 222 aprovados no Concurso Público promovido pelo Iphan, em 2005, sequer assumiram os cargos em virtude dos baixos salários e da falta de perspectiva de progressão na carreira.


 


Gestor do Patrimônio Cultural


 


Há 70 anos, o Iphan promove a identificação, fiscalização, proteção, restauração, revitalização e o registro de bens culturais. Em números, esse trabalho pode ser reconhecido nos cerca de 21 mil prédios tombados e de 13 mil sítios arqueológicos cadastrados, nos 79 centros e conjuntos urbanos históricos, além do vasto número de volumes bibliográficos, documentação arquivística, registros fotográficos, audiovisuais e acervo museológico. Atua nos núcleos históricos de cidades e capitais como Belém, São Luís, Recife, Salvador, Brasília, Cuiabá e Goiânia, o que envolve os interesses de um número estimado de 33 milhões de pessoas.


 


O Iphan também é, constitucionalmente, o tutor legal do patrimônio arqueológico situado em território brasileiro. Identificar, documentar, proteger e promover, fazem parte de suas rotinas, desenvolvidas em co-responsabilidade com estados, municípios e cidadãos. Além de manter um banco de memória da produção científica e o Cadastro Nacional de Sítios Arqueológicos (CNSA), regulamenta as atividades que envolvem o uso destes bens da União, como seu envio temporário para o exterior. Licencia previamente atividades de pesquisas acadêmicas e empresariais, ligadas aos projetos de impacto ambiental, como hidrelétricas, rodovias, gasodutos, distritos industriais, loteamentos, etc.
 


Por meio do trabalho de preservação realizado pelo Iphan, 17 bens culturais foram reconhecidos pela Unesco como Patrimônio Mundial – tais como os Centros Históricos de Ouro Preto, Olinda e Salvador e o Conjunto Urbanístico de Brasília – e dois foram inscritos na lista de Obras-Primas do Patrimônio Oral e Imaterial da Humanidade: a Arte Indígena Kusiwa e o Samba de Roda do Recôncavo Baiano.
Com relação ao Patrimônio Cultural Imaterial, dentre os 11 bens registrados estão o Frevo, o Tambor de Crioula do Maranhão, o Ofício das Paneleiras de Goiabeiras, o Círio de Nazaré e o Ofício das Baianas de Acarajé. E estão inventariados outros sete, tais como a Viola de Cocho, o Bumba-Meu-Boi do Maranhão e o Museu Aberto do Descobrimento. São realizados, ainda, os Planos de Salvaguarda dos bens culturais de natureza imaterial já inscritos nos Livros dos Saberes, das Celebrações, das Formas de Expressão e dos Lugares.


 


A autarquia também promove o Prêmio Rodrigo Melo Franco de Andrade, que visa reconhecer grupos e instituições sociais que desenvolvem ações de preservação do patrimônio cultural brasileiro, e mantém trabalhos de Educação Patrimonial, uma linha de publicações sobre nosso patrimônio, identidade e memória e cooperação nacional e internacional com diversas instituições afins.


 


Impactos da Paralisação


 


Com os servidores do Iphan em greve está paralisado o desenvolvimento dos trabalhos de cadastramento de sítios e licenciamentos arqueológicos, os projetos do Programa Nacional de Incentivo à Cultura (Pronac) para bens tombados e manifestações culturais de natureza imaterial, o atendimento aos pesquisadores e os projetos do Programa Monumenta, dentre outros.


 


Sem os licenciamentos arqueológicos não podem ser viabilizados empreendimentos do Plano de Aceleração do Crescimento – PAC, relacionados a rodovias e ferrovias, portos, usinas hidrelétricas, aeroportos e outras atividades fundamentais para o desenvolvimento da infra-estrutura do país.


 


Isso sem falar dos museus, espaços e centros culturais que são importantes locais de visitação para conhecer aspectos da história e da cultura brasileira. E ainda mais neste mês de julho, quando o Brasil sediará os Jogos Pan-Americanos, que atrairão para o Rio de Janeiro milhares de turistas. Certamente, essas instituições fechadas causarão impacto no turismo e repercussão negativa na imagem do país no exterior.


 


Portanto, é necessário reconhecer a importância da ação do Iphan para a população brasileira, que não só convive, mas atua em parceria com o Instituto na preservação de sua memória e de sua identidade cultural. Os servidores que trabalham diretamente nesta área são profissionais especializados e por isso devem ser respeitados, atendidos pelo governo com seriedade e não tratados com descaso.