Inácio Carvalho – Uma oportunidade perdida
A Câmara dos Deputados deixou passar uma grande oportunidade de fazer uma mudança significativa no sistema político partidário brasileiro. Ao rejeitarem a lista pré-ordenada e, conseqüentemente, o financiamento público de campanha, a maioria, ainda con
Publicado 02/07/2007 09:22 | Editado 04/03/2020 16:37
Se o objetivo da reforma política é corrigir as distorções e fortalecer as agremiações partidárias, o que for aprovado estará distante do que se pretendia. A lista pré-ordenada, que no Brasil já foi utilizada em outras ocasiões, como na eleição para a Assembléia Constituinte de 1946, resultaria no fortalecimento real dos programas partidários em detrimento da valorização de candidaturas individuais. O sistema atual, além de limitar o voto à escolha de indivíduos e não de idéias, estimula a disputa interna nos partidos privilegiando os candidatos que disponham de mais recursos financeiros e maior estrutura de campanha. O deputado Arnaldo Faria de Sá deixou isso claro ao afirmar ''Eu e muitos outros parlamentares fomos eleitos pelo suor e pelo nosso sacrifício''. Ele e a maioria dos deputados que se pronunciaram contra a lista pré-ordenada são políticos personalistas, caciques regionais ou parlamentares sem apego às estruturas partidárias. O que eles temiam era que as mudanças nas regras eleitorais lhes tirassem prestígio e poder de barganha junto ao eleitorado e o que é pior, junto a lideranças empresariais que financiam campanhas.
Um outro aspecto é que não há como instituir o financiamento público de campanha sem a lista pré-ordenada. Portanto, o prejuízo passa a ser dobrado. Um dos grandes problemas do Brasil é justamente o financiamento privado das campanhas. Mesmo com algumas limitações e um pequeno controle pela justiça eleitoral, os gastos das campanhas atuais chegam a ser acintosos. Alguns candidatos a deputado chegam a ter campanhas maiores do que as de candidaturas majoritárias. O financiamento público permitiria uma redução dos gastos e uma possibilidade de maior fiscalização.
Um dos argumentos contra a lista pré-ordenada era de que ocorreria uma mudança brusca, que o eleitorado não está acostumado a isto. Isto é uma meia verdade já que o Brasil, como está dito acima, já viveu a experiência semelhante. Mas admitindo-se uma transição, buscou-se um sistema de lista flexível, em que o eleitor votaria na lista e teria a opção de indicar também o candidato de sua preferência. Ainda assim prevaleceu a candidatura individual. Dizia-se também que o povo brasileiro não está preparado para votar em partidos e sim no seu próprio candidato. Aqui cabem algumas perguntas: será que o povo vai aprender a votar não votando? Já que a maioria dos países adota a lista pré-ordenada, será que os eleitores dos outros são mais preparados do que o eleitor brasileiro? Como fortalecer os partidos privilegiando os projetos individuais? Aqui vale o que disse o deputado Flávio Dino (PCdoB-MA), para quem não há sistema ideal nem reforma boa em si mesma. Para ele, o sistema híbrido representa ''o diálogo do sonho com o possível e foi proposto a partir das necessidades históricas do País''. Na verdade este sonho está postergado na medida em que o aspecto mais importante da reforma política foi abandonado no início do processo de votação. Vamos torcer para que o estrago não seja maior.
Inácio Carvalho é Secretário de Comunicação do PCdoB/Ce e Coordenador no Ceará do Mandato do Deputado Federal Chico Lopes