Movimento pelo voto nulo culpa TSE pelo fiasco

Um dos fundadores e moderadores do movimento diz que interpretação do tribunal sobre voto nulo esvaziou campanha.

Nas eleições 2006, houve uma avalanche de comunidades no site de relacionamentos Orkut defendendo o voto nulo, mas o resultado final foi pífio. O número de eleitores que anularam o voto no primeiro e segundo turnos para presidente ficou muito próximo do pleito de 2002.


 


 


Há quatro anos, segundo o Tribunal Superior Eleitoral (TSE), o primeiro turno teve 7,36% de votos nulos e o segundo, 4,12%. Neste ano, houve uma diminuição em relação ao primeiro turno e um pequeno aumento no segundo. Os percentuais foram 5,68% e 4,71%, respectivamente.


 


 


A maior das comunidades era a “MobilizAÇÃO Voto Nulo”, que aparecia neste sábado com mais de 27 mil integrantes. A “VOTO NULO, VOTO LIBERTÁRIO” tinha mais de 6 mil, enquanto a “Voto Nulo, Voto Consciente”, terceira maior, somava mais de 4 mil membros.


 


 


Segundo o advogado Homero Moutinho Filho, um dos fundadores e moderadores do “Movimento Brasil Nova Era”, que criou diversas comunidades do voto nulo, incluindo a “MobilizAÇÃO Voto Nulo”, as comunidades chegaram a ter juntas mais de 45 mil membros.


 


 


“Somando todas as comunidades, chegamos a mais de 45 mil membros, sendo que a 'MobilizAÇÃO Voto Nulo', que tinha quase 35 mil, era a maior”, afirmou Moutinho Filho, que culpa o Tribunal Superior Eleitoral pelo enfraquecimento do movimento.


 


 


“A campanha estava indo bem, com os jovens mobilizados em todo o país. Mas o que atrapalhou foi o TSE, que, simplesmente, reinterpretou a lei, dizendo que apenas os votos anulados pela Justiça Eleitoral poderiam anular a eleição. Foi uma ducha de água fria”, disse ele.


 


 


Segundo o advogado, a lei era bem clara. “Se houvesse 50% de votos nulos mais um, a eleição seria anulada. No entanto, foi gravíssimo o que o TSE fez, passando por cima de uma lei. O presidente do TSE, Marco Aurélio Mello, foi completamente contra a lei”, disse.


 


 


Em 6 de setembro, antes do primeiro turno, em meio à onda de correntes na internet pregando o voto nulo, o presidente do TSE havia afirmado que os votos anulados pelo eleitor, chamados por ele de “votos apolíticos”, não poderiam anular a eleição.


 


 


“Temos que interpretar a lei à luz da Constituição, que será eleito presidente da República aquele que obtiver, considerados os votos válidos – e afastados os nulos e brancos – mais de 50% desses votos. Onde a lei não distingue, não cumpre ao intérprete distinguir. O não-voto, ou seja, o voto apolítico não influi quanto a um segundo escrutínio”, havia explicado Marco Aurélio Mello.


 


 


No entanto, na opinião de Moutinho Filho, o TSE procurou esvaziar o movimento pelo voto nulo.  “Eles estavam com medo que o movimento abalasse a estrutura da Justiça Eleitoral. Se não fosse o TSE, o movimento teria crescido”, analisou o moderador do “Movimento Brasil Nova Era”.


 


Eleições 2008


 


 


Apesar da tentativa de ver na ação do TSE o “motivo” pelo fracasso do movimento, os ativistas da campanha pelo voto nulo reconhecem que o apelo foi ignorado pela quase totalidade do eleitorado.


 


 


Apesar disso, eles não desistem. Menos de duas semanas após o segundo turno e depois do fracasso do movimento nas eleições 2006, o site de relacionamentos Orkut já conta com uma comunidade defendendo o voto nulo para as eleições municipais de 2008.


 


 


Criada em 6 de novembro, a comunidade “Anula Brasil 2008” defende: “Vote Nulo para vereador e prefeito! Essa é sua chance de protestar nas urnas por um governo mais justo, já que muito provavelmente vai ser difícil escolher um candidato”.


 


 


Região Norte teve menor percentual de anulações


 


 


No segundo turno da eleição presidencial de 2006, a região Norte teve o menor percentual de votos nulos do país. Apenas 2,17% dos eleitores nortistas anularam o voto, o que representa uma redução de 26,2% em relação ao segundo turno de 2002.


 


 


As demais regiões do país tiveram percentual superior a 4%. No Centro-Oeste, a taxa ficou em 4,46%. Logo atrás, aparece o Sudeste, que registrou 4,60% de votos nulos. O Sul totalizou 4,74% e o Nordeste, 5,6%.


 


 


Os três estados com menor percentual de nulos também são do Norte. Amazonas registrou o menor índice, (1,85%). Na seqüência, ficaram os estados de Rondônia (1,93%) e do Amapá (1,97%).


 


 


Entre os 12 estados do país que tiveram os percentuais mais baixos de votos nulos, sete são da região Norte. Roraima foi o quinto neste quesito, com 2,04%; Pará, o sétimo (2,25%), Acre, o décimo (2,43%); e Tocantins, o 12º (2,72%).


 


 


Já os oito estados líderes em votos nulos tiveram também segundo turno para governador. As únicas exceções foram o Pará e o Rio Grande Sul, que não definiram o governador no primeiro turno, mas apresentaram o sétimo menor percentual de nulos (2,25% cada um).


 


 


O Rio de Janeiro foi o campeão de votos nulos para presidente no segundo turno, com 9,68%, seguido por Pernambuco (9,21%), Maranhão (8,54%), Rio Grande do Norte (8,43%), Goiás (7,51%), Paraná (6,52%), Santa Catarina (6,4%) e Paraíba (6,31%).


 


 


Campeão de votos nulos, Rio é “reduto” de Heloísa


 


 


O cientista político Geraldo Tadeu Moreira Monteiro, diz acreditar que a  expressiva votação de Heloísa Helena (PSOL) no Rio de Janeiro, onde ela teve a maior votação do país no primeiro turno, teve reflexos no aumento de votos nulos no estado.


 


 


“Acho que dá para fazer um paralelo entre a votação da Heloísa com o crescimento de votos nulos no segundo turno, pois tem a ver com o grande número de funcionários públicos da União na capital fluminense. Até hoje, têm mais funcionários públicos no Rio do que em Brasília”, disse Monteiro, presidente do Instituto Brasileiro de Pesquisa Social (IBPS) e professor da Universidade do Estado do Rio de Janeiro (UERJ).


 


 


No primeiro turno, Heloísa recebeu no Rio 17,13% dos votos válidos (1.425.699), respondendo por mais de 21,6% dos votos obtidos por ela em todo país. O percentual entre os eleitores fluminenses foi mais de três vezes superior ao da candidata no país (6,85%).


 


 


Sem Heloísa, o percentual de votos nulos no estado subiu quase 40% entre o primeiro e o segundo turnos da eleição, passando de 6,92% (640.788) para 9,68% (871.469). Comparado ao segundo turno de 2002, o aumento de nulos no segundo turno de 2006 foi de 153,4%.


 


 


O cientista político da UERJ relaciona ainda o crescimento no número de votos nulos principalmente a uma parcela da classe média intelectual pertencente às universidades, que, antes era ligada ao PT, mas se mostrou decepcionada com o primeiro mandato de Lula. 


 


 


“Sociologicamente, a classe média intelectual ligada às universidades, que é dissidente do PT, tem uma influência importante, apesar de não ser grande numericamente. Foi um voto (nulo) muito ideológico, que não se decidiu entre Alckmin e Lula no segundo turno”, analisou.


 


 


Em relação às correntes e comunidades na internet que defendiam o voto nulo, Monteiro disse acreditar que elas podem ter influenciado os eleitores fluminenses, mas que não chegaram a alcançar uma parcela muito significativa do eleitorado.


 


 


“A campanha pelo voto nulo influenciou uma pequena parcela da população, pois o acesso à internet ainda é pequeno. De uma maneira geral, teve pouca influência nacionalmente e ficou bastante diluída”, disse o cientista político da UERJ.


 


 


O Rio de Janeiro foi o único estado brasileiro que apresentou crescimento no percentual de votos nulos no primeiro e no segundo turnos da eleição presidencial deste ano em comparação com o pleito de 2002, segundo levantamento do G1.


 


 


Há quatro anos, o Rio de Janeiro teve o menor percentual de votos nulos no primeiro turno do país, com 4,33%. No segundo, o percentual foi o 14º menor (3,82%). Já em 2006, os percentuais subiram para 6,92% (primeiro) e 9,68% (segundo).


 


 


Em 2006, em 20 estados brasileiros houve diminuição no número de votos nulos nos dois turnos em comparação a 2002, enquanto cinco estados apresentaram crescimento de nulos no segundo turno. Já em um estado, o aumento foi no primeiro turno.


 


 


Nos estados em que se verificou aumento no percentual de votos nulos no segundo turno em relação a 2002, o Rio Janeiro registrou o maior crescimento: 153,4%. Na seqüência, ficaram Pernambuco, com 148,2%; Goiás, com 135%; e Maranhão, com 110,8%.


 


 


Na avaliação do cientista político Geraldo Tadeu Moreira Monteiro, presidente do Instituto Brasileiro de Pesquisa Social (IBPS) e professor da Universidade do Estado do Rio de Janeiro (UERJ), os números “revelam uma insatisfação do eleitor fluminense com o mercado político e as opções apresentadas”.


 


 


Além disso, Monteiro destaca que o Rio de Janeiro apresenta características diferenciadas do restante do país. Ele cita, por exemplo, o fato de o Rio de Janeiro ser o “estado mais urbanizado do país, com 75% da população concentrada na região metropolitana e 42% na capital.”


 


 


“Acho que você tem substrato sócio-econômico no Rio de Janeiro que explicaria um voto mais crítico, mais pragmático e mais exigente. O Rio de Janeiro tem essa característica muito saliente, com alto nível de escolaridade”, destacou o cientista político.


 


Fonte: O Globo